domingo, 8 de novembro de 2009

AS PELADAS DE MINHA INFÂNCIA/ADOLESCÊNCIA

O blog do véio é visitado por jovens de todas as idades. Adeptos de todos os esportes. A expressão “PELADAS’ é entendida por qualquer praticante de futebol. Mas, pode haver visitantes que a desconheçam. As peladas deste texto não se referem às mulheres desnudas. Na época aqui reportada o acesso a nus artísticos eram extremamente limitados. Esses mulherões de nossa mídia atual nem em sonhos habitavam nossa mente. No máximo a gente tinha acesso a um livreto com desenhos pornográficos. E, mesmo aí, não se viam mulheres com suas vergonhas de fora, como escreveu Pero Vaz Caminha em sua carta ao rei de Portugal. Imaginem com as vergonhas escancaradas, como algumas mulheres, de hoje, se deixam filmar e fotografar.

A pelada a que refiro é uma expressão ainda hoje em uso. Aqueles joguinhos de fim de tarde ou de fim de semana, onde um grupo de amigos se reúne e bola uma partidinha de futebol. Um tira teima para ver quem é mais grosso e quem está mais fora de forma da turma. A divisão dos times era tirada no par ou impar. Pelos dois goleiros ou pelos dois reconhecidos craques do grupo. Os demais ficavam na ansiedade, um misto de preocupação e de vontade de ser logo escolhido.

A razão é obvia. Os melhores eram escolhidos em primeiro lugar e iam formando os times. Um dado momento percebia-se, que um dos times estava ficando mais forte. Aí os demais adicionavam à ansiedade o desejo de pertencer ao time com melhores chances de ganhar a pelada. O nervosismo e os trejeitos desses grossos e infelizes eram cômicos. Contorciam-se, davam risos nervosos, as mãos de alguns chegavam a acenar. Tudo involuntariamente, tomados apenas pelo desejo de pertencer ao time mais forte.

Eu era dessa leva, grosso e de fama reconhecida, ficava sempre para o final. Em dias de sorte vibrava quando o meu nome era escolhido à três ou quatro grossos do final.

Era uma humilhação? Era. Mas, também era a única forma de se dividir equanimente os times de modo que pudesse haver um jogo mais equilibrado, com mais disputa, com mais condições de valorizar o time vencedor e dar suporte a gozação que seriam alvos os times perdedores.

Eu já estava habituado. Ser um dos últimos à saber em que time ia jogar, já não machucava tanto. Eis que um dia, um desses fresquinhos, tido como craque nos imputou a suprema humilhação.

Estávamos no final da formação dos times. Restavam apenas dois. Eu era um deles. O cara olha para nós, na dúvida, sem saber quem era o menos grosso. Sacou a frase. A suprema humilhação. Vocês podem jogar no time deles. O cara acreditava que era melhor ter-nos como adversários. Ainda que ficasse com um número menor de jogadores.

Essa humilhação não deu para resistir. Depois dela passei a jogar de goleiro. A razão era simples. Os goleiros eram os primeiros a serem escolhidos ou os responsáveis por escolher os demais jogadores do seu time. Com o tempo aprendi a escolher tão bem que estava sempre no time vencedor. No final, sempre encontrava um amigo cansado para me substituir no gol e eu me tornava um jogador de linha.

Vejam como o mundo dá voltas, de grosso dos times na infância, passei a um jogador mediano na adolescência. É lógico, que nosso time dificilmente vencia. Francamente, tenho dúvidas, se eu tinha adquirido alguma habilidade na infância, que me permitiu melhor classificação na idade pré-adulta ou se o novo grupo era de tão baixo nível que eu só podia subir na classificação.

Nesse grupo da adolescência, um destaque era o Mário, nascido na Bahia, criado no Rio de Janeiro, tinha a malemolência do baiano, a ginga e o molejo do malandro carioca. Nosso representante da raça negra. O apelido seria Pelé, Rei, Príncipe, não fôsse a pouca intimidade que tinha com a bola.

Outro a pertencer ao grupo, embora sem o destaque baiano, era o Edson, o bailarino, pépépé espera aí, não era bailarino pelo futebol que jogava, mas pelo modo que flutuava nos bailinhos do ginásio. Habilidade com a bola? Nenhuma.

Havia dois outros, uns cavalos, na expressão chula do esporte.

Um era o Coelho, apelido que nada tinha a ver com a velocidade de suas arrancadas futebolística. Ganhou-o em nossa mesa de cartas, pela sorte incrível. Sua habilidade motora, não desenvolvida na infância, fazia com que partisse pra cima dos adversários com pernas e braços (desengonçados e desarticulados) atingindo na maioria das vezes as canelas do opositor, quando não, os torrões de terra ou as moitas de capim tão comum nos campos de várzea. A bola? Raramente.

O outro era o Patelho, síncope de Pato Pentelho, de origem portuguesa, sem a sensibilidade de um Fernando Pessoa, tinha a sutileza do estouro de uma manada de bufalos selvagens. Resolvia tudo numa simples patada. Essa mesma facilidade, e habilidade, no trato da bola, ele aplicava em seus raros ensaios com as garotas. A sutileza, a falta de tato e a gagueira que o acometia nesses ensaios faziam com que seu sucesso nessa área fosse limitado. Inexistente eu diria. E bola jogava? Não. Uma lástima!

Está claro. Eu não tinha melhorado minhas habilidades futebolistica. Eu diria haver uma lacuna, um vácuo a ser preenchido. Constatado o fato irreversível de não ter nenhum talento para o futebol, aos 16 anos de idade, este que vos escreve, concentra-se de corpo e alma nos estudos.

A limitação desse grupo no esporte era mais que compensada pela amizade e companheirismo. Esses caras são meus amigos até hoje. Constituímos nossas famílias, nasceram nossos filhos, nos tornamos compadres e nos encontramos de vez em quando.

Só uma coisa não nos permitimos. Jogar futebol. As peladas ficaram lá, na adolescência. Nos fins de semana passados no Clube de Campo de Osasco. Onde a lama de barro vermelho nos pintava de índios e amenizavam as derrotas semanais.


Vehio.

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